Apesar de ter sido criado em 1998 com o objetivo de avaliar o desempenho do estudante ao fim da educação básica, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ganhou outras funções nesses quase 20 anos de existência e hoje é considerado o maior exame educacional do país. A mudança instituída em 2009, quando a seleção passou a ser utilizada como mecanismo de seleção para ingresso no ensino superior, foi um dos fatores determinantes para que isso acontecesse.
O número de instituições de ensino que aderiram ao Enem cresceu, assim como o número de estudantes inscritos. Só em 2016, foram registrados 9.276.328 participantes. Em contrapartida, o aumento da relevância e procura pelo Exame também chamou a atenção de criminosos que viram na expectativa e ansiedade dos estudantes uma oportunidade para se beneficiarem financeiramente por meio de tentativas de fraude do Enem.
Por outro lado, o registro de fraudes e casos de quebra de sigilo motivou o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) a reavaliar e propor mudanças constantes no método de organização e aplicação do Enem e reforçar o esquema de segurança de todo o processo, a cada edição. Conheça as principais fraudes registradas nos últimos anos, suas consequências e as alternativas adotadas pelo órgão para evitar a repetição da situação.
Quebra de sigilo
Em 2009, funcionários do consórcio contratado para aplicação do Enem retiraram exemplares da prova de dentro da gráfica que imprimia o material e tentaram vendê-los a um jornal paulista. O Ministério da Educação (MEC) foi acionado pelo veículo faltando apenas dois dias para o Exame e optou por suspender imediatamente as provas que aconteceriam em 3 e 4 de outubro. O Enem 2009 só aconteceu nos dias 5 e 6 de dezembro, com índice histórico de abstenção de 40,6%.
Dois anos depois, um professor de física foi denunciado por ter divulgado antecipadamente 14 questões do Enem para alunos de um colégio particular de Fortaleza. Ele teve acesso às perguntas em 2010, quando a escola participou de um pré-teste do exame. Na época, o MPF chegou a acusar duas funcionárias do Inep de tentar ocultar falhas na fiscalização durante a aplicação desse pré-teste, mas o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) rejeitou a denúncia. Por outro lado, a Justiça Federal anulou os 14 itens das provas dos candidatos da respectiva escola.
Já em 2014, candidatos do Piauí, Ceará e Paraíba receberam o tema da prova da redação horas antes do início do segundo dia de provas, por um aplicativo de mensagens. A Polícia Federal no Piauí confirmou que houve vazamento do tema da redação, mas o MPF/CE decidiu arquivar a investigação e a prova não foi prejudicada. Em 2015, foram divulgadas fotos das supostas capas dos cadernos rosa e azul, contudo, o Inep negou a veracidade das imagens.
Equipamentos eletrônicos e quadrilhas
Alguns meses antes do Enem 2013, a Polícia Civil de Minas Gerais já havia identificado diálogos sobre uma suposta fraude no Exame, por meio da utilização de ponto eletrônico, quando deflagrou a Operação Hemostase, investigação que desarticulou uma quadrilha que fraudava vestibulares particulares de Medicina. Naquele ano, 1.522 candidatos foram eliminados no Enem por uso de pontos de escuta, porte de equipamentos eletrônicos, consulta a conteúdos externos e outras tentativas de fraude durante a realização das provas.
Em 2014, a Polícia Federal no Ceará constatou que pelo menos 40 estudantes da região Nordeste tinham sido beneficiados por um esquema de fraude, na última edição, para ingressar de forma irregular em universidades públicas, inclusive em cursos concorridos como Medicina. Por um valor de R$ 30 mil, a quadrilha enviava, por mensagem de celular, o gabarito da prova ao participante que contratava o serviço. A Operação Apollo expediu mandados de busca e apreensão no Ceará, Paraíba e Piauí.
Também em 2014, a Polícia Civil e o Ministério Público mineiro prenderam mais de 30 pessoas suspeitas de fraudar o vestibular de medicina da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e o Enem, como desdobramento da Operação Hemostase II. Além disso, o Enem 2014 eliminou 236 candidatos por uso indevido de celular.
Já em 2015, um candidato cearense foi preso em flagrante suspeito de utilizar um aparelho eletrônico durante a realização das provas. Os fiscais desconfiaram que o homem estaria com algum objeto proibido quando ele retornava do banheiro, a poucos minutos para o encerramento do exame, e o submeteram ao detector de metais e revista pessoal, quando foi comprovada a suspeita. Nesta edição, 677 estudantes foram eliminados por uso de equipamentos inadequados.
Reforço na segurança
Até 2009, a logística de aplicação do Enem era de responsabilidade da empresa que tivesse vencido a licitação. A partir daí, com o caso de roubo do caderno de questões e quebra de sigilo, o MEC implantou mudanças na forma de contratação de serviços que permitiram maior controle do processo.
Além de envolver as secretarias de Segurança Pública dos estados, Forças Armadas e Polícia Federal em toda a estrutura do exame, as provas passaram a ser impressas em uma gráfica de segurança máxima e o processo de deslocamento e distribuição dos cadernos de questões pelos Correios passou a contar com batedores. O número de fiscais também aumentou.
Em 2010, a proibição do uso de relógio na hora da prova passou a constar no edital do Exame como meio de garantir a segurança e o sigilo da prova. No ano seguinte, um dispositivo eletrônico foi instalado na gráfica para detectar possíveis erros de impressão, e o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) passou a supervisionar todo o processo. Também foi nesta edição que passou a valer a proibição do uso de lápis e borracha e a exigência de desligar o celular e depositá-lo em um porta-objetos ao entrar na sala de aplicação.
Os lacres eletrônicos foram utilizados, pela primeira vez, no Enem 2012, contudo somente em 10 mil malotes de provas, cerca de 25% do total. No ano seguinte, a medida foi adotada integralmente. Nessa época, batalhões do Exército, Polícia Rodoviária Federal, policiais militares e civis dos estados também passaram a integrar a forte esquema de segurança para aplicação do Exame.
Em 2014, o MEC inseriu a utilização de detectores de metais no ambiente de aplicação de provas e a eliminação de candidatos por publicação de fotos ou mensagens nas redes sociais. Também foi instituído um local seguro, com segurança máxima, para elaboração das provas e criado o Comitê Gestor de Tecnologia da Informação para discutir e otimizar fatores relacionados à segurança do Enem.
Já em 2015, servidores do Executivo passaram a atuar como certificadores para acompanhar o processo de monitoramento e controle, nos dias de prova, e o MEC instituiu o intervalo de 30 minutos entre o fechamento dos portões e o início das provas como nova medida de segurança. A última medida de segurança anunciada foi a implantação da identificação biométrica, em 2016.